
Queria saber o que mais tenho em mim e que foge deliberadamente ao meu controle, ao meu domínio. Aquilo que não está em mim, mas que é em mim. O que me abre diariamente os olhos. Queria identificar aquilo que, apesar de parecer estar em meu interior, me absorve como algo que se expande sem parar. Aquilo que dilacera tudo por dentro, mas me envolve. Queria poder distinguir o porquê da alegria do porquê da tristeza. Mas parece que tal distinção não há. O porquê é um só. Queria entender minha aflição, as minhas frequentes inexistências ou, então, ter a certeza de que elas é que, na verdade, são o meu existir. Queria encontrar uma via ao nada persistente em mim, o qual me agride sem fim e me destoa aqui. Queria saber o que não me compõe, o que é presente quando ausente estou. Queria radiografar minha alma. Queria um caleidoscópio inverso para alcançar o meu verso. Queria sumir de mim, prostrar-me à minha frente e observar-me do lado de lá, a fim de vasculhar o confuso lado de cá. Queria saber o que agora me dá sono e morbidez, por quê nunca consigo ser somente um, mas dois ou três. Queria saber por quê me abalo sem razão; por quê, quando caio, não levanto do chão; quando choro, só enxugo com as mãos. Queria enxergar o que está tão perto de mim, mas não me é permitido ver; aquilo que pra sempre quero, até quando não tenho porque. Mesmo nesse instante, é isso o objeto do meu querer. Queria uma passagem ao fundo do fundo, ao berço de tudo, ao quarto escuro da criação. Mas se a tivesse, a volta seria ilusão. Queria uma palavra que me desmontasse, que me reduzisse ao desconhecido elemento primário da vida. Queria sentir a estranha sensação de saber o que sou.
Somente queria, pois a realização do desejo não me trará a satisfação. Queria e só queria.